O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu, nesta segunda-feira (17), que os policiais militares acusados de espancar e matar a garçonete Luana Barbosa dos Reis, em Ribeirão Preto, em 2016, serão julgados pela Justiça comum, encerrando uma longa disputa jurídica sobre a competência para julgar o caso. A decisão é vista como um marco importante na luta contra a violência policial e na busca por justiça para as vítimas de abuso de autoridade.
Luana, uma mulher negra, lésbica e mãe de um menino de 14 anos, foi brutalmente agredida por três policiais durante uma abordagem. A violência aconteceu após ela se recusar a ser revistada por agentes do sexo masculino, exigindo o direito de ser revistada por uma policial mulher. A recusa desencadeou uma série de agressões, que culminaram em sua morte dias depois, em decorrência de complicações causadas pelos ferimentos graves na cabeça.
Desde 2016, o caso Luana Barbosa tornou-se um símbolo de resistência e luta contra a violência policial, o racismo estrutural e a opressão de minorias, como a população LGBTQIA+. A abordagem violenta e desproporcional foi amplamente condenada por organizações de direitos humanos, que desde o início do processo demandavam que o julgamento ocorresse na Justiça comum, em vez de ser conduzido pela Justiça Militar.
A decisão do STF foi recebida com alívio pela família de Luana e por militantes que acompanham o caso. Para eles, o julgamento na Justiça comum aumenta as chances de uma responsabilização efetiva dos policiais envolvidos, pois a Justiça Militar, historicamente, tende a tratar casos de abuso cometidos por agentes de segurança com maior leniência.
Segundo os advogados da família, o processo enfrentou diversas tentativas de protelação por parte da defesa dos policiais, que buscavam transferir o julgamento para a Justiça Militar sob o argumento de que a ação ocorreu durante o exercício da função policial. No entanto, o STF entendeu que a gravidade das acusações — tortura e homicídio — ultrapassa a competência militar, sendo uma questão de interesse da sociedade como um todo.
A morte de Luana e a recente decisão do STF têm gerado repercussão em todo o país, reacendendo o debate sobre o racismo institucional e a violência de gênero. Organizações como a Anistia Internacional e a Comissão Interamericana de Direitos Humanos têm acompanhado o caso de perto, destacando a importância de decisões como essa para coibir a impunidade em casos de violência cometida por agentes do Estado.
Especialistas em direitos humanos apontam que a decisão do STF pode abrir precedentes para que outros casos semelhantes, em que policiais são acusados de violência desproporcional, também sejam julgados pela Justiça comum. “É um passo fundamental para assegurar que a justiça seja feita, principalmente em casos onde há um claro abuso de poder. A violência policial precisa ser julgada de forma independente, para que as vítimas tenham uma chance real de justiça”, afirmou uma advogada especializada em direitos civis.
A decisão do STF é especialmente significativa para a comunidade de Ribeirão Preto, onde o crime aconteceu. O caso de Luana gerou grande comoção na cidade, com protestos organizados por movimentos de mulheres, grupos LGBTQIA+ e ativistas negros. Para muitos, a violência contra Luana foi um reflexo do preconceito estrutural que ainda permeia as forças de segurança no Brasil.
Durante os anos em que o processo se arrastou, o nome de Luana tornou-se um símbolo da luta por direitos e igualdade, e sua história foi lembrada em marchas e manifestações por todo o Brasil. A resistência da família em buscar justiça inspirou diversas outras mães e parentes de vítimas de violência policial a fazer o mesmo. “A luta não é só pela Luana, é por todas as mulheres negras e periféricas que são alvos de violência todos os dias. É uma questão de justiça e de direitos humanos”, afirmou a irmã de Luana em uma entrevista recente.
O caso Luana Barbosa é apenas um entre milhares de registros de violência policial no Brasil. Dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública mostram que a letalidade policial no país atinge desproporcionalmente jovens negros e moradores de periferias. A morte de Luana revelou, mais uma vez, a vulnerabilidade de grupos minoritários diante de abordagens violentas e arbitrárias, muitas vezes motivadas por preconceitos raciais, de gênero e de classe.
Grupos de direitos humanos têm pressionado para que as forças policiais passem por reformas profundas, com ênfase em treinamentos sobre direitos humanos, igualdade de gênero e racismo. A implementação de políticas de accountability (responsabilização) é vista como essencial para combater a impunidade e evitar que casos como o de Luana se repitam.
Com a decisão do STF, o processo contra os três policiais acusados de matar Luana Barbosa deve avançar na Justiça comum, onde serão julgados por homicídio qualificado e tortura. A família de Luana, que vem lutando por justiça há quase uma década, aguarda ansiosa pelo desfecho do julgamento, na esperança de que a responsabilização dos culpados traga algum alívio e sirva como um exemplo de que a violência policial não ficará impune.
Enquanto isso, a memória de Luana segue viva nas ruas e nas manifestações, como um lembrete da importância de continuar lutando contra o racismo, a violência de gênero e a opressão policial. A decisão do STF é um passo importante, mas a batalha por justiça e igualdade continua, impulsionada pela força e resiliência daqueles que, como a família de Luana, não desistiram de exigir um futuro mais justo e seguro para todos.